As longas guerras do Sahel
Autor invitado: Jonuel Gon?alves (*)
A inicial expans?o islamica nesta longa faixa n?o decorreu de opera??es militares, como no Egito ou no Magreb. Comerciantes ¨¤rabes foram o elemento principal no processo, ajudados em seguida por alguns pregadores, embora no caso oeste africano a revolu??o Almoravida tenha tido influ¨ºncia. Neste lado do Sahel, o come?o da presen?a mu?ulamana teve lugar no s¨¦culo XI, com caracter¨ªsticas de religi?o das camadas dirigentes (ou religi?o da Corte). S¨® mais tarde evoluiu para religi?o popular, no termo de um longo percurso que, em certas ¨¤reas da sub-regi?o, durou at¨¦ ao s¨¦culo XVI.
A entrada islamica na costa oriental africana ¨¦ anterior, havendo indica??es de sua presen?a nos atuais Qu¨ºnia e Tanz?nia desde o s¨¦culo VIII.
No s¨¦culo XV, Tombuctu fazia parte do imaginario arabe e europeu, em virtude de historias dos viajantes ¨¢rabes sobre o impacto do com¨¦rcio de ouro. Mesmo estas hist¨®rias tendo sido bastante atenuadas em seguida, manteve-se o lado simb¨®lico da cidade. Na mesma ¨¦poca, Mogadiscio foi celebrada como grande centro urbano e comercial em cronicas portuguesas, sobretudo do historiador Jo?o de Barros.
Desde finais do s¨¦culo XX, as duas cidades - e seus respectivos pa¨ªses - voltaram aos grandes notici¨¢rios em virtude da implanta??o de importantes redes ligadas ¨¤ Al Qaida. No caso maliano, tratou-se de mais uma influ¨ºncia procedente da vizinha Arg¨¦lia, com a mudan?a de nome pelo Grupo Salafista pela Ora??o e o Combate transformado em Al Qaida do Magreb Isl?mico (Aqmi) hoje mais ativa no Sahel ocidental (Mauritania, Mali, Niger) que na Arg¨¦lia onde foi fundada.
Uma alian?a de facto foi criada entre Aqmi, o Movmento pela Unicidade e Jihad na ?frica do Oeste (MUJOA) e o movimento Ansar Edinne, dirigido por um influente lider Tuaregue, contrario ¨¢ independencia regional e favoravel ¨¤ aplica??o da sharia (lei coranica) em todo o Mali. O MNLA que tinha conquistado as cidades de Kidal, Gao e Tombuctu, foi desalojado militarmente por estes movimentos, enquanto o ex¨¦rcito maliano, com poucos efetivos e material reduzido, retirou. O Mali fiocu dividido.
Humilhados pela derrota e culpando os pol¨ªticos de Bamako, capital maliana, oficiais malianos executaram um golpe militar que p?s fim ao regime democratico existente no pa¨ªs e at¨¦ ent?o considerado dos mais consolidados em todo oeste africano. A Comunidade Economica dos Estados da ?frica do Oeste (CEDEAO) promoveu um acordo de regresso a governo civil; na pratica os militares golpistas permanecem muito influentes. Ao mesmo tempo, a CEDEAO prop?s-se enviar uma for?a armada de Estados membros para refazer a unidade do pa¨ªs. Tambem lan?ou uma iniciativa de media??o, conduzida pelo Presidente do Burkina Faso, na qual um dos objetivos pirncipais ¨¦ afastar o Ansar Edinne da alian?a com os jihadistas.
Esta semana, o Ansar Edinne, o MNLA e uma delega??o do governo do Mali encontraram-se na capital burkinabense, Uagadugu, em negocia??es preparat¨®rias para uma solu??o pol¨ªtica. Isto n?o impede o prosseguimento dos preparativos militares e algumas divergencias sobre eles. Um documento do secretario-geral da ONU insiste mais em negocia??es pol¨ªticas e seu enviado especial - o italiano Romano Prodi - afirmou que uma opera??o militar n?o ser¨¢ vi¨¢vel antes de setembro 2013; os Estados Unidos, pela voz do seu comandante militar para ?frica, general Carter Ham, constata que a maior parte do efetivo oeste africano previsto para intervir no Mali, ¨¦ composto por soldados treinados para manuten??o de paz e n?o para a??es ofensivas.
A Fran?a, a CEDEAO e o Presidente em exerc¨ªcio da Uni?o Africana, ao contr¨¢rio, insistem na urgencia da a??o militar.
Do outro lado do continente, prossegue a guerra somali, iniciada na d¨¦cada de 1980 com a queda da ditadura de Siad Barre ap¨®s um conflito de configura??es classicas com a Etiopia, ent?o apoiada pela ex URSS e Cuba. Uma grande analogia de base se estabeleceu relativamente ao Afeganist?o. Tal como neste pa¨ªs, os clans - grupos de familias que acreditam terem antepassados comuns - somalis ganharam dimens?o de partidos pol¨ªticos armados, chefiados por senhores da guerra. O caos e a viol¨ºncia instaurados, abriram espa?o para a cria??o de forma??es pol¨ªticas islamistas favoraveis ao jihadismo. Inicialmente, adotaram posturas de agrupamentos humanitarios e aplicadores da lei coranica. Taliban no Afeganist?o, Uni?o dos Tribunais Islamicos (UTI) na Som¨¢lia.
A UTI dividiu-se, tendo um largo setor aderido ao Governo Federal de Transi??o, apoiado pela Uni?o Africana e sua respectiva for?a militar, com um efetivo de cerca 17 mil homens. Alem disso, permanecem tropas etiopes em ¨¢rea importantes como Baidoa (perto de Mogadiscio) e tropas quenianas, no extremo sul, com relevo para o porto de Kismayo.
Da ala contraria ao Governo Federal de Transi??o na antiga UTI saiu o movimento Al Shebab, declaradamente integrado na constela??o Al Qaida e que controla grande parte do pa¨ªs. Durante algum tempo ocupou mesmo Mogadiscio, de onde foi expulso pelas tropas etiopes. O importante porto de Kismayo s¨® lhe foi reconquistado h¨¢ poucas semanas, gra?as a uma opera??o anfibia, com presen?a destacada de unidades quenianas. Com alguma regularidade, as posi??es do Al Shebab s?o bombardeadas pela avia??o norte-americana, com bases na vizinha Republica de Djibuti e na ilha de Diego Garcia. Os jihadistas somalis s?o suspeitos de terem papel de relevo nos atentados contra as embaixadas USA em Nairobi e Dar Es Salam, na d¨¦cada de 1990 e, mais recentemente, executaram um mortifero atentado na capital ugandesa, Kampala, alem de raptos no Norte do Qu¨ºnia.
Esta semana, um grupo bem armado do Al Shebab atacou em pleno Puntland uma coluna de soldados locais, causando no m¨ªnimo dez mortos e varios feridos. Poucos dias antes, o novo Primeiro Ministro da Etiopia, em presen?a do recem eleito (em assembleia de chefes tradicionais ) Presidente do Governo Federal de Transi??o somali, Hassan Cheick Mahmoud, declarou que as tropas de seu pa¨ªs s¨® retirar?o da Somalia quando forem substuit¨ªdas por tropas da Uni?o Africana.
Dois dois lados do grande Sahel, a interven??o de for?as sub-regionais aparece assim como a tend¨ºncia dominante contra o jihadismo.
(*) Jonuel Gon?alves. Investigador en el Instituto de Estudios Estrat¨¦gicos de la UFF (R¨ªo de Janeiro) y en el Centro de Estudios de la Educaci¨®n y Desarrollo (Ondjiva, Angola). Sus libros m¨¢s recientes son: A economia ao longo da Historia de Angola y Relato de guerra extrema. Desde Brasil escribe El blog de Jonuel. Publicaremos a partir de hoy algunas entradas simultaneamente (siempre que se pueda).
(**) Mapas de Mali (Min. Aff. ?trang¨¦res, Par¨ªs) y Somalia (BBC).
(***) En los d¨ªas en que se escribi¨® este post el primer ministro de Mali dimiti¨® tras ser detenido por militares que participaron en el golpe de Estado. Y la Casa Blanca buscaba poderes para la lucha antiterrorista en el Norte de Mali.
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